quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

 


Eles correram por baixo das asas do morcego - o porteiro - e entraram no corredor escuro. O simpático vaga-lume estava esperando por eles.

"Você se divertiu?", perguntou. "Você conseguiu falar com o rei Oberon?"

"Ah, sim! foi uma festa alegre", disse João, "você sempre tem que ficar aqui no corredor escuro?"

"Eu escolhi isso livremente", disse o vaga-lume, em tom melancólico e amargo. "Não sinto mais prazer nessas festas cheias de vaidades."

"Ora", disse Filho da Madrugada, "você tem certeza?"

"É como eu digo. No passado houve um tempo em que eu também ia a festas, dançava e me divertia com essas bobagens. Mas agora fui purificado pelo sofrimento, agora...'

E ele ficou tão emocionado que sua luz se apagou novamente. Por sorte, eles estavam perto da saída, e o coelho, que os ouviu chegar, moveu-se um pouco para o lado, de modo que a luz da lua pudesse iluminá-los.

Assim que saíram chegando junto ao coelho, João disse: "Conte-nos sua história, vaga-lume".

"Ah!", suspirou o vaga-lume, "é simples e triste. Vocês não vão gostar".

"Conte, conte", diziam todos.

"Bem, todos vocês sabem que nós, vaga-lumes, somos criaturas muito especiais. Sim, acho que ninguém se atreveria a negar que nós, vaga-lumes, somos os mais dotados de todos os seres vivos."

"Por quê? Eu não sabia", disse o coelho.

Com desprezo, o vaga-lume então perguntou: "Você pode brilhar no escuro?" "Não! Isso não", confessou o coelhinho.

"Pois bem, a gente pode! Todos nós podemos! E podemos brilhar muito ou pouco, de acordo com a nossa vontade. A luz é o melhor presente da natureza e a luz é o objetivo mais alto que um ser vivo pode alcançar. Alguém gostaria de contestar a nossa prioridade? Nós, machos, também temos asas e podemos voar por quilômetros.

"Também isso não consigo fazer", confessou humildemente o coelhinho. "Pelo dom divino da luz que temos", continuou o vaga-lume, "outros animais nos poupam, nenhum pássaro nos atacará. Apenas um animal, o mais ínfimo de todos, nos procura e nos leva embora. E esse animal é o homem, a monstruosidade mais detestável da criação."

João olhou para Filho da Madrugada naquele desabafo, como se ele não entendesse. Mas Filho da Madrugada sorriu e acenou para que ele ficasse em silêncio. "Uma vez voei alegremente, como uma luz brilhante e errante entre os arbustos escuros. E num relvado solitário e húmido, à margem de uma vala, habitava ela, cuja existência era inseparável da minha felicidade. Ela brilhava lindamente em esplendor esmeralda pálido enquanto se arrastava entre os talos brilhantes e, poderosamente, encantou meu jovem coração. Voei ao redor dela e fiz o possível para atrair sua atenção, mudando o meu brilho. Vi com gratidão como ela sentiu minha saudação e modestamente escureceu a sua luz. Tremendo de emoção, eu estava prestes a dobrar minhas asas e cobrir a minha amada radiante prazerosamente, quando um   barulho tremendo encheu o ar. Figuras sombrias se aproximavam. Eram seres humanos. Fugi apavorado. Eles me perseguiram e me atacavam com grandes coisas negras. Mas minhas asas me carregavam mais rápido do que suas pernas pesadas." 'Quando voltei...'

Aqui a voz do narrador falhou. Só depois de um momento de emoção silenciosa, durante o qual os três ouvintes ficaram respeitosamente em silêncio, ele continuou:

"Você já pode imaginar. Minha terna noiva, a mais brilhante e esplêndida de todas, havia desaparecido, levada pelo homem perverso. O gramado silencioso e úmido havia sido pisoteado e o seu lugar amado pela vala era escuro e vazio. Eu estava sozinho no mundo.

"Aqui, o coelho sensível novamente puxou uma orelha para enxugar uma lágrima de seu olho.

"Eu mudei desde então. Tenho nojo de todas as diversões vãs. Só penso nela que perdi e no momento em que voltarei a vê-la."

"Oba! Você tem alguma esperança?", perguntou o coelho com alegria. "Tenho mais do que esperança, tenho certeza. Lá em cima verei a minha amada novamente".

'Mas...' queria inserir o coelhinho.

"Coelho", disse o vaga-lume gravemente, "posso entender que qualquer um deve duvidar de quem tem que tatear no escuro. Mas quando se pode ver, ver com os próprios olhos, então, qualquer incerteza é um mistério para mim. Lá!", disse o vaga-lume, olhando reverentemente para o céu estrelado, "lá eu os vejo! Todos os meus pais, todos os meus amigos e também ela, brilham claramente, num esplendor ainda mais glorioso do que aqui na terra. Ah! Quando serei capaz de me levantar dessa vida rasteira e voar para aquela que me acena? Ah! Quando? Quando?'

Suspirando, o vaga-lume deixou seus ouvintes e se dirigiu de volta para dentro da toca escura.

"Pobre criatura!" disse o coelhinho: "Espero que ele esteja certo".

"Espero que sim", acrescentou João.

"Tenho receio disso", disse Filho da Madrugada, "mas foi muito tocante".

"Querido Filho da Madrugada", começou João, "estou muito cansado e com sono".

"Ora, venha ao meu lado e eu te cobrirei com o meu manto.

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