"Hei, hei", disse ele, meio para si mesmo,
"você é um ratinho corajoso".
"Não sei de quem ter medo", disse uma voz fina, e o
ratinho mostrou os dentes como se estivesse rindo.
João já estava acostumado com muitas coisas maravilhosas, mas
agora seus olhos se arregalaram novamente. No meio do dia e na escola, era
inacreditável.
"Você não precisa ter medo de mim", ele disse
baixinho, com medo de assustar o rato, "você vem em nome do Filho da
Madrugada?"
"Eu só vim te dizer que o professor tem toda razão, e
que você mais do que mereceu o seu castigo."
"Mas Filho da Madrugada disse que o sol era masculino, o
sol era nosso pai." "Sim, mas ninguém mais precisa saber disso. O que
as pessoas têm a ver com isso? Você nunca deve falar com as pessoas sobre
assuntos tão delicados. Eles são muito rudes. O homem é uma criatura
incrivelmente má e desajeitada, que prefere pegar e atropelar até a morte tudo
o que está ao seu alcance. Nós, ratos, temos experiência disso."
"Mas ratinho! Então por que você fica perto dele? Por
que você não vai para longe, para a floresta?"
"Bem, não podemos mais fazer isso. Estamos muito
acostumados com a comida da cidade. E se alguém tiver cuidado para evitar suas
armadilhas e seus pés pesados, dá para ele se mover entre as pessoas humanas.
Felizmente, ainda somos bastante rápidos. O pior é que o homem deve remediar
seu próprio desgaste fazendo uma aliança com o gato, o que é uma grande
calamidade, mas na floresta há corujas e gaviões e todos nós devemos morrer um
dia. Agora, João, lembre-se do meu conselho, aí vem o professor!"
"Ratinho pequeno! ratinho! Não vá embora. Pergunte ao Filho
da Madrugada o que devo fazer com a minha chave. Pendurei-a no pescoço, no
peito nu. Mas vou trocar de roupa no sábado e tenho muito medo que alguém a veja.
Diga-me onde posso guardá-la com segurança, querido ratinho!"
"Debaixo da terra, sempre debaixo da terra, é onde tudo
está mais seguro. Quer que eu a guarde para você?'
"Não! Aqui na escola não.”
"Então, depois enterre lá fora, nas dunas. Vou avisar
meu sobrinho que é rato-do-campo para cuidar dele".
"Obrigado, ratinho!"
Bum! Bum! O professor apareceu. Quando João mergulhou a
caneta no tinteiro, o ratinho havia desaparecido. O professor, que desejava ir
para casa, perdoou ao João as últimas quarenta e oito linhas de castigo.
Durante dois dias, João viveu em constante medo. Ele foi
mantido sob estrita vigilância e privado de qualquer oportunidade de escapar
para as dunas. Era sexta-feira e ele ainda andava com a preciosa chave. Na
noite seguinte, ele teve que trocar de roupa e a chave estava para ser
descoberta e tirada dele. Só de pensar ele congelou. Ele não ousava escondê-la
na casa ou no jardim, nenhum lugar lhe parecia seguro o suficiente.
Era sexta-feira à noite e o crepúsculo escurecia o céu. João
sentou-se à janela de seu quarto, olhando ansiosamente para os arbustos verdes
do jardim, para as dunas distantes. "Filho da Madrugada! Filho da
Madrugada! me ajude", sussurrou ansioso.
Havia uma batida suave de asas ao seu lado, ele sentiu o
cheiro dos lírios-do-vale e, de repente, ouvia a doce voz familiar.
Filho da Madrugada pousou ao seu lado no peitoril da janela e
deixou os sinos de um lírio-do-vale balançarem no caule esguio.
"Finalmente, você chegou!? Tenho muitas saudades de
você", disse João.
"Vem comigo, João, vamos enterrar a sua chave."
"Não posso", suspirou João tristemente. Mas Filho
da Madrugada tomou-o pela mão e João sentiu-se flutuando pelo ar calmo da
noite, leve como a semente fofa de um dente-de-leão.
"Filho da Madrugada", disse João, enquanto
flutuava, "Eu te amo muito. Creio que daria todos os homens por você e
Presto também.
Filho da Madrugada
disse: "E Simão?"
"Ah, Simão não se importa tanto se eu o amo ou não. Acho
que ele considera isso muito infantil. Simão só ama a peixeira e isso também só
quando está com fome. Você acredita que Simão é um gato comum, Filho da
Madrugada?"
"Não, ele já foi gente."
Uau! Bum! Um besouro gordo voou contra João. "Não dá
para olhar por onde você voa", resmungou o besouro, "essa fada voa
como se tivesse o monopólio de todo o ar! Isso é o que acontece quando alguém
só voa por prazer. Alguém como eu, que cumpre seu dever e está sempre
procurando comida e come o máximo que puder, é jogado fora do seu curso por
isso."
Sob um zumbido alto, voou embora.
"Ele nos culpa por não comermos?", perguntou João.
"Sim, esse é um costume próprio do besouro. Para os
besouros-de-maio, o maior dever é comer muito. Gostaria que lhe conte a
história de um menino besouro?"
"Sim, conte, Filho da Madrugada." "Era um
lindo besouro jovem que tinha acabado de sair debaixo do chão.”
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