terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

O Pequeno João

 


Chegaram a uma trilha de formigas. Centenas de formigas andavam concentradas, algumas delas carregando pedacinhos de madeira, folhas ou lâminas de grama em suas mandíbulas. Era uma turbulência tão grande que deixou o João quase tonto.

Demorou muito tempo até que uma das formigas quisesse falar com eles. Estavam todas muito ocupadas. Finalmente, encontraram uma formiga velha, que havia sido designada para tomar conta dos pulgões, dos quais as formigas tiravam a melada. Como seu rebanho de pulgões estava muito calmo, ele podia agora entreter-se com os estranhos por um tempinho e mostrar-lhes o grande ninho. Este estava ao pé dum tronco de uma árvore velha, muito grande e rico com centenas de passagens e salas. O pastor dos pulgões dava explicações e mostrava tudo aos visitantes, até mesmo os quartos das crianças, onde as larvas jovens rastejavam para fora das pupas brancas. João ficou espantado e encantado.

A velha formiga me disse que eles estavam em uma grande agitação por causa da campanha que estava prestes a acontecer. Outra colônia de formigas, não muito longe, seria atacada com grande força, o ninho delas seria destruído, e as larvas roubadas ou mortas. Para isso, todas as forças seriam necessárias e, portanto, o trabalho mais urgente tinha que ser feito primeiro.

"Por que essa campanha?", perguntou João. "Não me parece bem".

"Não! Não", disse o guarda dos pulgões, "é uma jornada muito bonita e louvável. Você deve saber: são as Formigas Guerreiras que vamos atacar.

Vamos exterminar a raça delas e isso é um trabalho muito bom."

"Vocês então não são Formigas Guerreiras?"

"Claro que não! O que você acha? Somos Formigas da Paz".

"O que isso significa?"

"Você não sabe? Deixe-me explicar. Certa vez, todas as formigas estavam constantemente lutando; não passava um dia sequer sem grande matança. Então uma formiga sábia e boa veio e pensou que pouparia muitos problemas se as formigas concordassem entre si em não lutar mais.

"Quando ela disse isso, as formigas acharam muito estranho e, por isso, começaram a mordê-lo e tirando dele pequenos pedaços. Mais tarde, vieram outras formigas que pensavam a mesma coisa. Elas também foram mordidas e deixadas em pedaços. Mas enfim vieram tantas que morder estava dando muito trabalho para as outras.

"Então elas se chamavam de Formigas da Paz e todas insistiam que a primeira Formiga da Paz estava certa. Aquelas que contradiziam isso, por sua vez, foram despedaçadas. Desta forma, quase todas as formigas hoje se tornaram Formigas da Paz e os pedaços da primeira formiga da Paz são preservadas com cuidado e reverência. Nós temos a cabeça. A verdadeira. Já destruímos e massacramos outras doze colônias que diziam ter a verdadeira cabeça. Agora, restam apenas quatro. Eles se chamam Formigas da Paz, mas é claro que são Formigas Guerreiras, porque nós é que temos a cabeça real e a Formiga da Paz tinha apenas uma cabeça. Agora vamos exterminar a décima terceira colônia. Portanto, esse é um bom trabalho."

"Sim! "Sim", disse João, "é muito notável".

Na verdade, ele havia ficado um pouco assustado e sentiu-se muito mais calmo quando eles felizmente se despediram do pastor dedicado e estavam descansando e balançando em uma lâmina de grama longe das formigas, à sombra de uma graciosa folha de samambaia.

"Puxa!", suspirou João, "essa era uma companhia sanguinária e estúpida".

Filho da Madrugada riu e balançou sua lâmina de grama para cima e para baixo. "Ora!", ele disse, "você não deve chamá-las de estúpidas. As pessoas humanas estudam as formigas para se tornarem mais sábias."

Assim, Filho da Madrugada mostrou a João todas as maravilhas da floresta. Ambos voaram para os pássaros nas copas das árvores e nos arbustos densos, desceram para as habitações artísticas das toupeiras e viram o ninho duma abelha no velho tronco da árvore.

Por fim, chegaram a uma clareira cercada de vegetação rasteira. A madressilva crescia em grande abundância. Por toda parte os galhos luxuriantes se enrolavam sobre os arbustos e as grinaldas perfumadas de flores se destacavam entre a vegetação. Um bando de chapins levantou voo e tremulava entre as folhas, chilreando e tuitando ruidosamente.

Vamos ficar aqui um pouco", pediu João, "é lindo aqui".

"Muito bem", disse Filho da Madrugada. "Então você vai ver algo divertido."

No chão havia campânulas azuis na grama. João sentou-se ao lado de uma e começou uma conversa sobre as abelhas e as borboletas. Elas eram boas amigas da campânula e, por isso, a conversa transcorreu sem problemas.

O que foi isso? Uma grande sombra cobriu a grama e algo como uma nuvem branca desceu sobre a campânula. Mal João teve tempo de fugir e voou para Filho a Madrugada, que estava sentado no alto de uma flor madressilva. Então ele viu que a nuvem branca era um lenço e bumba! Uma senhora gorda sentou-se no lenço e na pobre pequena campânula que estava embaixo.

Não teve tempo de ter pena, pois o murmúrio de vozes e o ranger dos galhos enchiam a clareira da floresta. Uma multidão se aproximou.

"Agora vamos rir", disse Filho da Madrugada.

Lá vinham eles: o povo. As mulheres com cestos e guarda-chuvas nas mãos, os homens com chapéus altos, retos e pretos. Em sua maioria, todos os chapéus eram pretos, muito pretos. Na floresta verde e ensolarada, eles pareciam grandes e feios manchas de tinta numa bela pintura.

Arbustos foram espalhados, flores pisoteadas, muitos lenços brancos foram espalhados e as sofridas lâminas de grama e as plantas do musgo paciente cederam com um suspiro sob o peso que tinham que suportar e temiam nunca se recuperarem do ataque.

A fumaça de charutos se rolava sobre os arbustos de madressilva e dissipava raivosamente a delicada fragrância de suas flores.

Vozes altas afugentavam o alegre bando de chapins que se refugiavam nas árvores mais próximas com chilrear assustado e indignado.

Um homem levantou-se da multidão e ficou em pé numa pequeno elevado. Ele tinha cabelos longos e loiros e um rosto pálido. Ele disse alguma coisa e então todas as pessoas escancararam a boca e começaram a cantar, tão alto que os corvos voaram de seus ninhos altos gritando e os curiosos coelhos, que tinham vindo da beira das dunas para dar uma olhada, correram apavorados e continuaram a correr por um quarto de hora, até se sentirem seguros de volta nas dunas.

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