Foi, sem contestação, Ari Barroso.
A princípio, nome nacional; depois, internacional, vulgarizando, no mundo da
música, o nome do Brasil. Tenho, em minha frente, o trabalho, em três volumes,
contendo a biografia do grande maestro, que a paciência beneditina de Dalila
Luciana redigiu. É a mais extensa que conheço em nosso país, pois o “Estadista
do Império”, de Nabuco, e o “Estadista da República”, de Afonso Arinos, são
mais estudos da época do que simples monografias pessoais. São 1.168 páginas
dedicadas ao nosso imenso conterrâneo, acervo imorredouro de fatos, dados e
fotografias. Longe de ser completo, Ari Barroso era inesgotável, é a maior
contribuição que se pode desejar a um ídolo perene.
Quando entrei para o Ginásio
Ubaense, iniciando o curso secundário, o maestro de nosso cinema havia passado
no vestibular da Faculdade de Direito e retornara à terra. O Diretor, professor
Lívio Carneiro, convidara-o para nos dar aulas, junto com outro acadêmico,
Aristófanes Amorim, aproveitando os valores novos da terra. Ari pouco se
demorou no magistério, pois o Nadir Aroeira pregou-lhe uma cauda de papagaio,
além de colocar carrapichos na cadeira do mestre, o que resultou na prisão da
classe, com a suspensão das aulas. Corria o ano de 1921. O fato levou-me à
transferência para o Ginásio São José, de onde tinha sido expulso o maestro,
como expulso foi, mais ou menos, de todos os colégios da região. Já era o
turbilhão, de que fala a autora.
Anos depois, em 1927, tornei-me
colega do maestro xará, na Faculdade de Direito. De quando em vez, voltava ele
à terra natal e nos encontrávamos com abundância de afeição e simpatia mútua.
A verdade é que seu conceito, na
cidadezinha, não era alto, pois as famílias e a moral da época não compreendiam
que um moço acadêmico pudesse levar a boêmia àquele extremo de ser carregado,
às costas dos companheiros, alta madrugada, para a casa de dona Ritinha. Os
excessos do artista o prejudicavam no meio acanhado.
Certa vez, na Faculdade, Ari
Barroso descobriu que seu primo Célio Rezende Teixeira (hoje, o desembargador)
ia prestar exame vestibular. Sem mais aquela, pegou-o pela gola do paletó,
exclamando:
— Célio, você vai prestar exame
para mim, no terceiro ano. Tenho compromisso de tocar no Belas Artes e não
posso perder 200$000.
Você está doido, Ari!
Mas Ari foi empurrando-o,
deixando-o, basbaque, na sala de provas, de pé, a nosso lado. Medindo o
ambiente, de todo desconhecido, Célio firmou-se nos calcanhares e saltou para
trás, caindo no corredor e, em disparada, ganhou a Rua do Catete, descendo-a em
desabalada corrida, enquanto Ari, atrás, gritava:
— Venha cá, Célio! Venha cá!
Ari, o gigante. Naquele tempo,
como enloqueceu o Rio com o “Dá Nela”! Os brasileiros, que corriam o mundo, em
todos os países, ouviam as suas composições musicais. Único brasileiro que
ganhou o “Oscar” dos Estados Unidos. Ordem Nacional do Mérito. Grande na
televisão, no teatro, no jornalismo. Maior em nosso Flamengo. Nossa amizade,
grande no correr da vida, foi anuviada, em 1962, por um pedido dele, que não
pude atender, mercê da palavra anteriormente empenhada. Ele se agastou e me
escreveu uma carta magoada, dizendo que nunca mais voltaria a Ubá. Ou se
voltasse, seria a horas mortas, para não encontrar ninguém... Pior é que
publicou a carta na “Tribuna da Imprensa”. Mas seu coração era grande demais,
Voltou à terra pouco depois, mais alegre e maior, o mesmo de sempre. Vou ler o
livro...
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