quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O Maestro Ubaense




    Foi, sem contestação, Ari Barroso. A princípio, nome nacional; depois, internacional, vulgarizando, no mundo da música, o nome do Brasil. Tenho, em minha frente, o trabalho, em três volumes, contendo a biografia do grande maestro, que a paciência beneditina de Dalila Luciana redigiu. É a mais extensa que conheço em nosso país, pois o “Estadista do Império”, de Nabuco, e o “Estadista da República”, de Afonso Arinos, são mais estudos da época do que simples monografias pessoais. São 1.168 páginas dedicadas ao nosso imenso conterrâneo, acervo imorredouro de fatos, dados e fotografias. Longe de ser completo, Ari Barroso era inesgotável, é a maior contribuição que se pode desejar a um ídolo perene.
    Quando entrei para o Ginásio Ubaense, iniciando o curso secundário, o maestro de nosso cinema havia passado no vestibular da Faculdade de Direito e retornara à terra. O Diretor, professor Lívio Carneiro, convidara-o para nos dar aulas, junto com outro acadêmico, Aristófanes Amorim, aproveitando os valores novos da terra. Ari pouco se demorou no magistério, pois o Nadir Aroeira pregou-lhe uma cauda de papagaio, além de colocar carrapichos na cadeira do mestre, o que resultou na prisão da classe, com a suspensão das aulas. Corria o ano de 1921. O fato levou-me à transferência para o Ginásio São José, de onde tinha sido expulso o maestro, como expulso foi, mais ou menos, de todos os colégios da região. Já era o turbilhão, de que fala a autora.
    Anos depois, em 1927, tornei-me colega do maestro xará, na Faculdade de Direito. De quando em vez, voltava ele à terra natal e nos encontrávamos com abundância de afeição e simpatia mútua.
    A verdade é que seu conceito, na cidadezinha, não era alto, pois as famílias e a moral da época não compreendiam que um moço acadêmico pudesse levar a boêmia àquele extremo de ser carregado, às costas dos companheiros, alta madrugada, para a casa de dona Ritinha. Os excessos do artista o prejudicavam no meio acanhado.
    Certa vez, na Faculdade, Ari Barroso descobriu que seu primo Célio Rezende Teixeira (hoje, o desembargador) ia prestar exame vestibular. Sem mais aquela, pegou-o pela gola do paletó, exclamando:
     Célio, você vai prestar exame para mim, no terceiro ano. Tenho compromisso de tocar no Belas Artes e não posso perder 200$000.
    Você está doido, Ari!
    Mas Ari foi empurrando-o, deixando-o, basbaque, na sala de provas, de pé, a nosso lado. Medindo o ambiente, de todo desconhecido, Célio firmou-se nos calcanhares e saltou para trás, caindo no corredor e, em disparada, ganhou a Rua do Catete, descendo-a em desabalada corrida, enquanto Ari, atrás, gritava:
    Venha cá, Célio! Venha cá!
    Ari, o gigante. Naquele tempo, como enloqueceu o Rio com o “Dá Nela”! Os brasileiros, que corriam o mundo, em todos os países, ouviam as suas composições musicais. Único brasileiro que ganhou o “Oscar” dos Estados Unidos. Ordem Nacional do Mérito. Grande na televisão, no teatro, no jornalismo. Maior em nosso Flamengo. Nossa amizade, grande no correr da vida, foi anuviada, em 1962, por um pedido dele, que não pude atender, mercê da palavra anteriormente empenhada. Ele se agastou e me escreveu uma carta magoada, dizendo que nunca mais voltaria a Ubá. Ou se voltasse, seria a horas mortas, para não encontrar ninguém... Pior é que publicou a carta na “Tribuna da Imprensa”. Mas seu coração era grande demais, Voltou à terra pouco depois, mais alegre e maior, o mesmo de sempre. Vou ler o livro...

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