quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A Sessão da Academia


A Sessão da Academia
A Academia Brasileira de Letras, sem embargo da pecha de reacionarismo que lhe movem os despeitados, é o mais alto cenáculo literário do país, a máxima aspiração de nossos intelectuais. Fugindo a uma aula, tipo “chata”, do Conde Cândido Mendes, resolvi assistir a uma sessão na Casa de Machado de Assis, Estava no prédio novo o Silogeu Brasileiro, oferecido ao insigne sodalício pela França, frente ao qual a estátua do fundador mostrava a austeridade do ambiente.
Entrei ali como num Templo. E enquanto Humberto de Campos lia a ata e o Barão de Ramiz Galvão procedia à leitura do “Relatório Anual”, cheio de frases feitas e em estilo demodè, estudava o meio e a fisionomia dos “imortais”. O Conde de Afonso Celso pronunciou uma oração no costumeiro sistema anedótico, tal qual as aulas que servia aos alunos da Faculdade.
Achei admirável, na verdadeira tonalidade acadêmica, o belo discurso pronunciado por Félix Pacheco, ex-Ministro das Relações Exteriores do Governo Bernardes e respeitado diretor do “Jornal do Comércio”.
A imponência de Alberto de Oliveira, então “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, a sua natural majestade, o aprumo e a longa cabeleira, não revelavam, de todo, seu inevitável desgaste físico. Falou do desenvolvimento da memória e contou que, nos fins do século passado, os literatos resolveram formar um clube na roça, perto de Niterói, para cultivar a retenção de fatos e coisas. Paula Ney e Guimarães Passos sobressaíram logo na arte de reter. A princípio, cada um recitava uma quadra. Depois, um soneto. Mais tarde, grandes trechos. E cada qual, nas declamações, se esforçava por testemunhar o progresso do método. Mas a maior surpresa que sentiu, ele, Alberto de Oliveira, foi quando, numa das sessões semanais, escreveu, de manhã, um soneto, decorou-o e o recitou para os sócios de Niterói. Mal acabou de declamar, Olavo Bilac acusou-o de plagiador, pois conhecia aquele soneto há muitos anos e até tinha o hábito de recitá-lo na infância. E repetiu, para a assistência ilustre, a poesia malfadada. As discussões se exasperaram. E só no fim do alarido, de ataques e defesas, Olavo Bilac confessou que bastava ouvir uma vez o recitativo para reproduzi-lo. E com o fato, o Clube se desfez...
Em verdade, quem mais me empolgou foi Coelho Neto. Orador mavioso e sedutor. Apesar de ter cento e tantas obras publicadas, de colaborar, semanalmente, no “Jornal do Brasil”, de ser considerado o estilista portentoso, ficou-me a imagem do palrador genial. Sua mímica era prodigiosa. As mãos falavam. Acompanhavam os gestos. Lembrou ele sua mocidade com Castro Alves, nas mesas de bar de São Paulo, escrevendo poesias aos eflúvios do liquido espumante. As noitadas de orgia dos moços da época. E suas mãos cortavam o ar, num arabesco evocativo, desenhavam figuras, subiam e desciam, rápidas como o pensamento, ou lentas como a emoção. A assistência se deleitava. Mas depois ocupou a tribuna um visitante português, Afonso Lopes Vieira, escritor de fama no tempo, em visita ao Brasil, numa linguagem sincopada, puxada nos rr, vocábulos cavalgando vocábulos, como um carro de rodas quadradas, na desarmonia do linguajar tipicamente minhoto...

Um comentário:

  1. Toc, toc, toc!
    Geminiano, com licença.
    Cheguei a este seu blog por um desses acasos da vida virtual.
    Gostei muito do conteúdo, da redação, essas coisas todas que seria ocioso enumarar aqui.
    A presente postagem atraiu-me a curiosidade em especial. Ler integralmente foi irresistível. Aqui, suas reminiscências de um passado distante frram-me altamente estimuladoras da imaginação.
    Foi prazerosa, bem prazerosa para mim esta breve leitura.
    Ah, somos colegas no exercício independente da tradução. Sabê-lo versado no idioma do qual traduziu toda a literatura citada, idioma no qual agora procuro iniciar-me como autodidata, me deixa esperançado de possíveis intercâmbios em breve futuro.
    Declaro aqui meu profundo respeito e grande admiração por seu trabalho.
    O que li no blog dá uma amostra de seu desempenho suficiente para que se adivinhe um profissional atento, cuidoso do estilo, essas coisas todas.
    Ofereço-lhe minha amizade. Caso deseje entabular conversas "offline", sirva-se à vontade de meu e-mail: joaoestevesalves@gmail.com.
    Se quiser honrar-me com visita a meus modestos espaços virtuais a partir do Blogspot, conte desde já com minhas boas vindas.
    De minha parte, o diálogo está aberto.

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